08/02/2010

Um assento de casamento com 128 anos

   Por me parecer deveras curioso, não resisti a transcrever abaixo um assento de casamento de 1881, ao qual, para melhor compreensão, actualizei a ortografia, mantendo apenas as assinaturas dos intervenientes tal e qual como se encontram no registo.

   Aos treze dias do mês de Novembro do ano de mil oitocentos e oitenta e um, nesta Igreja Paroquial de S. Pedro de Aboim, Concelho de Amarante, Diocese de Braga, perante mim compareceram os nubentes Joaquim Dias de Sousa Ribeiro e Dona Ana Joaquina Dias, os quais sei serem os próprios, com dispensa de proclamar e licença para o matrimónio de Sua Excelência Reverendíssima o Senhor Arcebispo Primaz das Espanhas, D. João Crisóstemo de Amorim Pessoa, e sem impedimento algum Canónico ou Civil para o casamento. Ele de trinta e dois anos de idade, solteiro, proprietário, natural de S. Jorge de Várzea, Concelho de Felgueiras, morador e baptizado na dita freguesia de Várzea, filho legítimo de José Dias e de Quitéria Maria, naturais de Várzea, e ela de vinte e quatro anos de idade, solteira, lavradora, natural, moradora e baptizada na freguesia de S. Pedro de Aboim, Concelho de Amarante, filha legítima de António José Gonçalves da Fonseca, natural de Aboim, e de Dona Josefa Dias, natural de Vila Cova, os quais nubentes se receberam por marido e mulher e os uni em matrimónio, procedendo em todo este acto conforme o rito da Santa Madre Igreja Católica Apostólica Romana. Foram testemunhas presentes, que sei serem os próprios, o Excelentíssimo Comendador António Dias Guimarães, Capitalista, residente na Cidade do Porto, e o Minorista Manuel Dias de Sousa Ribeiro, natural da freguesia de S. Jorge de Várzea, Concelho de Felgueiras. E para constar lavrei em duplicado este assento que, depois de ser lido e conferido perante os cônjuges e testemunhas, com todos assino, menos a cônjuge, por não saber, mas assinou a seu rogo, por ela lho pedir, a Excelentíssima Senhora Dona Conceição Amoroso Guimarães, Capitalista, do Porto. Era est supra.
Joaquim Dias de Souza Ribeiro
A rogo da Cônjuge Conceiçao Amoroso Guimaraes
Antonio Dias Guimaraes
Manoel Dias de Souza Ribeiro
O Pároco Antonio Clemente Coelho de Souza

   Um dos primeiros aspectos que me despertou a atenção, é que, terminada a leitura do documento, fica-se com a sensação de acabar de ler uma notícia da coluna social de um qualquer periódico de província. Não lhes parece?
   Outro aspecto, é a linguagem requintada do assento, que não tem paralelo com outros registos lavrados pelo mesmo Pároco. Por exemplo: onde se lê aqui “com dispensa de proclamar e licença para o matrimónio de Sua Excelência Reverendíssima o Senhor Arcebispo Primaz das Espanhas, D. João Crisóstemo de Amorim Pessoa” nos restantes lê-se “com todos os papéis de estilo correntes”.
   Veja-se então o tratamento cerimonioso dado a alguns dos intervenientes e que ninguém mais em Aboim o mereceu: a noiva Dona Ana Joaquina Dias, a mãe da noiva Dona Josefa Dias, a testemunha Excelentíssimo Comendador António Dias Guimarães e a sua esposa Excelentíssima Senhora Dona Conceição Amoroso Guimarães.
   Esclareço entretanto que o título de Minorista dado à segunda testemunha significa que este, preparando-se para o sacerdócio, ainda não tinha sido ordenado, sendo portanto um clérigo apenas com Ordens Menores.
   Termino com uma interrogação: quem seria este António José Gonçalves da Fonseca, com certeza um lavrador abastado de Aboim, cujas filha e esposa, ainda que a primeira fosse analfabeta e a segunda sê-lo-ia provavelmente também, mereciam a distinção do titulo de Dona. E mais: que relação manteria com este Comendador António Dias Guimarães e esposa, ambos capitalistas, residentes na cidade do Porto?
   Prometo que voltarei ao assunto.

1 comentário:

  1. Faleceu ainda recentemente, dia 13 deste mês, um senhor que deveria ser da família, atendendo ao nome: o Dr. José Dias de Sousa Ribeiro, também de Várzea-Felgueiras, que mais tarde residiu na então vila de Felgueiras e na década de 60, do séc. XX, foi presidente da Câmara Municipal de Felgueiras. Era distinto advogado, muito dado à cultura e dotado poeta, sendo deveras premiado em concursos de quadras populares. Residiu em Guimarães nos seus últimos anos.

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